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terça-feira, 22 de outubro de 2013

Cinismo Pela Manhã


Segue veloz o ônibus em que, imóvel, permaneço. Leio meu livro em silêncio, em meio ao barulho do veículo. Olho pela janela. Lá fora o tempo corre lento.
Vejo casas de todas as cores. Pessoas de todos os tipos.
Algumas entram e saem entre o abrir e fechar de portas do ônibus veloz. Momentos depois, o veículo está abarrotado de gente que nunca vi antes.
Umas cadeiras à frente, uma criança chora no colo da mãe. Um senhor cochila por trás de seus grandes óculos marrom. Duas mulheres riem alto de algo que eu não consigo discernir. Ao meu lado, um garoto de uns dez anos mata pessoas em um joguinho no seu celular. Em pé, ao lado dele, sua mãe reclama dele não largar o aparelho. Olha pra mim, resmunga que já não sabe mais o que fazer. Afinal, o que ela acha que posso fazer? Que eu dê a libertação a seu filho de seu joguinho maligno?
Definitivamente, não consigo compreender gente que simplesmente faz amizade dentro de um ônibus. É a primeira vez que viu a pessoa que está ao seu lado (e provavelmente, será a última) e, simplesmente você debulha toda a sua existência para um desconhecido? Para mim, ônibus, é o melhor lugar ara encontrar psicopatas. É sério. Você não tem noção de quem são aquelas pessoas; de onde elas vieram; o que fazem da vida; se planejam matar alguém na próxima esquina ou qualquer coisa do tipo. Talvez, mas só talvez, eu seja um pouquinho paranoica. Mas minha mãe vive dizendo que no mundo de hoje, você precisa se cuidar. Nunca se sabe de onde pode surgir algo ruim.
Olho mais uma vez pra mulher em pé e para o garoto ao meu lado; penso em dizer algo para acalmar o coração da mãe aflita ou até mesmo para o garoto viciado em matar pessoas em vídeo games. Mas, eu apenas faço cara de resignação e suspiro.
Dar palpite na vida de estranhos, não é do meu feitio. Recomeço minha leitura. O ônibus faz mais uma parada. Um homem vestido de palhaço entra e começa a dar bom dia em alta voz. A criança recomeça a chorar e eu me arrependo de não ter trazido meus fones de ouvido.
As mulheres que riam, agora aumentam ainda mais o volume das gargalhadas. Minha teoria é que não importa o quanto seu dia esteja ruim, ele sempre pode piorar dentro de um ônibus lotado. Mulher e garoto descem na parada em frente a praça. Sinto inveja deles por um instante. Se eu pudesse, desceria lá também e me sentaria embaixo de uma árvore e leria meu livro em meio ao silêncio. A impossibilidade de fazer isso me faz suspirar mais uma vez. Lembro que preciso voltar a ler, quando olho para o livro minha mão, vejo que não sai da primeira página e percebo que minha parada chegou. Levanto-me e começo minha longa jornada para conseguir chegar até a porta antes que o veículo siga seu rumo. Em meio a tanta gente espremida umas nas outras, falho na minha missão e só consigo descer na parada seguinte.
Encontro Maria, na entrada do trabalho.
- Bom dia, Georgia. - Diz ela, com um largo sorriso.
- Bom dia, Maria. - Retribuo o sorriso tentando não parecer cansada.
- Atrasa de novo? Por que você não compra um carro? Essa coisa de andar de ônibus não te cansa? - Diz ela, com aquele olhar de superioridade que me faz gostar menos dela, a cada dia.
- É. Ah, eu adoro andar de ônibus. É um ótimo lugar pra conhecer gente nova e fazer novas amizades. E um bom lugar pra ler também. Eu adoro.
Sorrio e me lembro do ônibus lotado que terei de pegar na minha volta pra casa. A vida é tão assim.